A QUALIDADE DA DEMOCRACIA: DOS POUCOS E DO POVO
JANUÁRIO, Sérgio S.
Mestre em Sociologia Política
Aos leitores: não há neste artigo quaisquer juízos de valor com referência à política, apenas esforço analítico sobre os tempos políticos atuais. Compreender é procurar entender.
A Democracia, como forma de governo [Teoria Clássica da Filosofia Política, Aristóteles] ou como uma das formas de República [Teoria Moderna da Filosofia e Ciência Política, Maquiavel] requer o protagonismo do cidadão nos processos decisórios. A República Democrática, neste caso, é o abstrato Governo do Povo, enquanto que a República Aristocrática é o Governo de Poucos.
É na qualidade e nas condições da participação do cidadão nos processos decisórios que produzem consequências coletivas que reside o nível de desenvolvimento da política como estrutura e organização e como cultura política [valor e parâmetro de referência para agir].
Como as cidades cresceram e sua complexidade se tornara ampla em extensão e profunda em intensidade, os modelos representativos de grupos se constituíram como a estrutura mais adequada e a dinâmica mais eficaz de representação. Daí que nasceram, no período moderno, o que conhecemos como Câmaras de Vereadores e Assembleias Legislativas.
Estes níveis de Parlamento têm as funções de contrapeso [Teoria Moderna do Estado] e se ajustam como elementos de fiscalização do Poder Executivo, elaboração de Leis para o desenvolvimento das cidades e dos estados, geração de regras para o funcionamento das relações sociais, econômicas, políticas, culturais.
Tudo, na Democracia, seria em nome do Povo. Nenhum movimento poderia estar vinculado ao desejo pessoal ou de pequenos grupos; nenhum privilégio, proteção ou distinção a grupos ou pessoas poderia prevalecer. A República Democrática somente poderia existir como Governo do Povo.
Na República Aristocrática, o Governo está nas mãos de poucos, como mediadores especiais, e orientado para todos, mas com seletividades de todas as ordens: privilégios econômicos e financeiros, concentração de poder político, benefícios nas relações sociais etc. A República Aristocrática nasce pela diferenciação entre pessoas, surge como privilégio de alguns. Sua origem está na subordinação de grupo pelo outro.
Em nossos municípios e em nossos estados, a aristocracia parece ganhar cada vez mais espaço. A começar pela forma de identificação como membros da nobreza [nobre vereador ou nobre deputado]. Mas isso poderia ser apenas uma alegoria no relacionamento não fossem outros aspectos.
Os parlamentares, de forma geral, se posicionam em relação ao poder executivo como situação ou oposição, e ficam de costas à população [embora algumas vezes até a usam como objeto de argumento e posicionamento]. É em troca de cargos e vantagens que elogiam e defendem um governante ou, pela falta de “espaços” o criticam e geram todas as dificuldades possíveis. Não é em nome de projetos e seus conteúdos, mas por causa do “grau de amizade política” no poder executivo. A fiscalização ao poder executivo é um campo de guerrilha ou de faz de conta. Não se estabelece como uma defesa dos interesses coletivos. Os votos dos parlamentares são contados antes, de acordo com os acordos entre pares ou ímpares.
Em uma República Democrática, ainda que fosse em seu maior ponto de desenvolvimento político, os parlamentares não poderiam votar sobre seus salários e vantagens; não poderiam decidir sobre a quantidade de comissionados e suas remunerações; não poderiam decidir sobre a quantidade de dias de sessão pública; não poderiam decidir se parlamentar estaria apto ou não a ocupar cargo no poder executivo... Em todos esses casos, em nome da moralidade de amanhã, os cidadãos seriam consultados em plebiscitos ou consultas amplas.
A República que temos nos dias de hoje é, claramente, Aristocrática, com baixa produtividade [veja-se a quantidade de projetos de leis elaborados, discutidos e votados nas câmaras de vereadores e assembleias legislativas], elevadíssimo custo de manutenção, privilégios atordoares do bom senso, e campo do personalismo político [eu fiz... eu fiz...] e patrimonialismo [meu cargo..., meu gabinete... meus funcionários].
Nosso parlamento é caro, ineficiente, aristocrático. É uma república de poucos, para poucos, em nome de poucos. A qualidade de nossa democracia necessita de reforma política que mude esse formato e essa maneira de existir. Mas antes, necessitaremos colocar em plebiscitos um conjunto de decisões, senão a raposa come a galinha.
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