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ELEITOR FABRICANTE DE POLÍTICA

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

 

Nossa cultura política tem problemas de todos os lados quando comparamos os resultados alcançados com os desejos ainda angustiantes em nosso dia a dia. Afirmamos, por várias vezes, que o fato de eu e você sermos eleitores, por direito e obrigação, não tem produzido vislumbres sobre cidadania. É translúcido que “nossos” deputados e “nossos” ocupantes de cargos executivos públicos não são nossos.

O tempo do eleitor [que não se confunde com cidadão] é o tempo das campanhas eleitorais, tempo em que eu e você podemos decidir [e essa é a única e solene oportunidade] algo na alquimia política. Depois disso, logo no dia seguinte mesmo, somos colocados de lado porque nossa importância eleitoral foi findada: a eleição acabou. Voltaremos a reencarnar os poderes do eleitor somente e tão somente no próximo período eleitoral. E tudo recomeça...

Mas se o processo se faz assim e se nos coloca desta forma, é evidente que o eleitor tem parte nessa história como protagonista da cultura política que nos orienta, nos cria e que, por nossas práticas, são orientadas e também resultam como nossa criação. Isso ocorre pelo fato de que nós interiorizamos os valores sociais e políticos [que nos são exteriores porque não nascem conosco] e, por outro lado, com os nossos atos, atitudes e comportamentos nós colocamos para fora nossas formas de ver e viver a vida [exteriorizamos o que nos é internalizado].

Nessas eleições, como em tantas outras, temos exteriorizado competitividades entre candidatos que surpreende pela falta de se procurar programas e valores de governo. Tudo começa e termina na pessoa do candidato. E este é como uma força invisível que nos conduz a defende-lo contra os outros candidatos, e nunca [nunca mesmo] numa busca por programas de governo como orientação ao futuro difícil de um país de extensão continental.

Faça um teste rápido: diga pelo menos 5 propostas claras e objetivas que você obteve de programas de governo que um candidato e seu grupo possam representar. Para um país como o Brasil e nas suas condições atuais, 5 propostas devem ser colocadas em 2 minutos. E devem estar interligadas entre si de modo intuitivo, rápido e claro. Difícil, muito difícil. É contra os outros candidatos que posicionamos o “nosso” candidato; é contra resultados de gestão de outros candidatos que defendemos “nosso” candidato.

E se por acaso “nosso” candidato vencer as eleições [e nunca seu programa de governo], então inexplicavelmente nos sentimos vitoriosos. Todavia, não porque o “nosso” candidato terá a árdua, difícil, superorgânica tarefa de organizar diretrizes políticas, sociais e econômicas de uma nação sem povo, mas pelo fato de que todos os outros perderam. Alguns chegam a torcer para que tudo dê errado, muito errado e, assim, se comprova que o “outro” candidato era melhor [ainda que não tenha sido experimentado e isso seja o mesmo que um delírio acusatório sem provas].

Programas de governo são tão secundários que são realizados às pressas e não servem de referência para quaisquer debates, entrevistas ou algo que o valha. Não votamos em programas, nos iludimos com promessas, tantas e tantas vezes prometidas, e nunca, nunca cumpridas. Pouco importa como motivação ou como resultado: logo após o dia da eleição, adversários que não se toleravam durante a campanha poderão ser vistos abraçados e trocando “possibilidades governamentais”. E a higiene moral é a de que não se deve fazer as coisas “olhando pelo retrovisor”.

De um lado e de outro, eleitores vivem se “armando” pelas acusações e defesas de “seus” candidatos, símbolos da luta diária contra os outros. Não temos, de forma democrática, uma eleição, senão uma “guerra política” na qual o vencedor se constrói na derrota dos adversários. Com seu protagonismo, o eleitor, ao exteriorizar essa “guerra” revela seus diminutivos políticos, seus “desvios democráticos” e sua “audácia autoritária”.

E tudo se fará em tempos de amanhã, com a mesma luta, outros “candidatos”. Mais adiante, depois de os “guerreiros” se recolherem aos seus “quartéis”, serão apontados os derrotados e celebrados os “vitoriosos”. Vencer uma eleição é o início de um desafio Herculano de gestão, num modelo incapaz de trazer o eleitor para a categoria de cidadão. A vitória de um candidato poderá lhe render um cargo, poderá lhe trazer “oportunidades” governamentais ou mesmo apenas satisfação pessoal, como um time de futebol que se sagra campeão. Mas não tem gerado, nem de perto, cidadãos, cidadania.

Nossa Democracia, que surgiu torta e sem povo, fraca e faminta, só poderá ser revigorada quando se enxergar no espelho, ver a si mesma e reconhecer seus desajustes. Essa tarefa é nossa! Vem aí as AULESTRAS EXITUS! Aguarde!



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