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MATERIAL INFLAMÁVEL DA POLÍTICA: PODER

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

 

Aos leitores: não há neste artigo quaisquer juízos de valor com referência à política, apenas esforço analítico sobre os tempos políticos atuais. Compreender é procurar entender.

 

O período pelo qual passamos estivera carregado de promessas de renovação na política, a despeito de que a renovação da política ainda seria tormento de estradas longas e incertas. Não sejamos tolos: a transformação política precisa de extensos tempos para se consolidar. Mas, a esperança que vale é aquela que pode ser perseguida hoje e amanhã, sempre revigorada em cada eleição. Por causa disso, em nome do voto e não do eleitor, muitos movimentos assumiram rótulos de antissistema. E isso é o suficiente para motivar eleições e eleitores.

O grande enredo antissistema surgiu com as operações da Lava Jato, hoje desgastada com os vazamentos referidos aos comportamentos e intencionalidades de seus operadores. Não nos referimos aos resultados alcançados e sua envergadura de provas sobre corrupção, a maior de todos os tempos modernos. Foram justamente esses conglomerados de provas e o impressionante volume de dinheiro recuperado que reafirma a condição de relações de roubos, desvios e corrupção com a impressão digital e a arrogância de nossos governantes.

As eleições presidenciais percorreram esses trajetos de representação do antissistema, com a Política de Enfrentamento do Eleitorado usando os dedos para registrar sua revolta e sua ira. Não foi em nome de um novo modelo de governo e de programas de desenvolvimento que o eleitorado se manifestou, mas contra a corrupção e a estupidez do poder político.

O então candidato Jair Bolsonaro foi o símbolo do antipetismo e do antissistema. Nenhum outro candidato conseguiu se apoiar nesta identidade e nesta necessidade. Seria preciso então formar um governo capaz de responder às angustias de cada um. Ser antissistema vale muito para o período eleitoral, mas vale pouco ou quase nada para o período de gestão, dado que o interlocutor deixa de ser o eleitor e passa a ser outros membros do sistema [parlamentares, membros do sistema judiciário, governos de Estado...].

Mais do que causar desgastes em adversário é preciso fazer acontecer programas e políticas de desenvolvimento. O primeiro ano do governo Bolsonaro está chegando ao seu fim, mas quase nenhuma reforma ou resultado de política de Estado foi solidificada. E já não importa se é por causa do Congresso ou do Judiciário. O que vale, como esperança de cada dia, é que a legitimidade política e social do Governo está a se diluir, a evaporar em dia de sol ardente, como um sorvete a derreter em nossas mãos.

Agora, com todas as desafetações do PSL, passamos a perceber que o “rei está nu”, sem as camisolas antipetistas a lhe sustentar ou sem o sobretudo das reformas políticas, quaisquer que sejam. Lutas por recursos eleitorais ou de fundos partidários, a falta de maturidade política de membros familiares, a espada apontada entre aliados de ontem parecem deslocar a esperança para o deserto. E o espanto se transforma na expressão mais característica.

É evidente que o PSL não é hoje, por nunca ter sido ontem, um partido sustentado por militância política e social, ou um partido enraizado nas ruas das cidades e dos bairros onde moramos. Tornou-se um partido relevante em virtude de resultados eleitorais conquistados no movimento antissistema. Porém, com todos os tropeços e desorientações públicas, com as entranhas expostas em gravações telefônicas, a corda de sustentação política começa a apresentar sua corrosão. Para além das aparências há material inflamável: o poder!

O Brasil poderá estar novamente à deriva, sem comandante, sem líder, sem esperanças. E, de costas ao desenvolvimento político, voltaremos a lutar contra grupos e contra símbolos. Que a guerra se faça nas eleições! E que a conquista se faça no governo!  Porque política não é de um moço, mas sim de estradas! Estradas longas e incertas!

 

Sugestão de trilha sonora: Clube da Esquina II

Autor: Milton Nascimento, Márcio Borges e Lô Borges

Interprete: Flávio Venturini

Álbum de Milton Nascimento

Data de lançamento: 1978

 

Imagem: google imagem



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