SER JOGADOR É DO JOGO!
JANUÁRIO, Sérgio S.
Mestre em Sociologia Política
Você já deve ter ouvido esta expressão muitas vezes: “É do jogo”. O jogo vem antes do jogador; está antes da consciência do jogador. Por ser jogo, por se manifestar em fluxos de interação e interrelação determinados em regras, o jogo não concede que o jogador se coloque diante do jogo como diante de um objeto. O jogo é Ordem das coisas, o destino de sentimentos, o caminho do comportamento. O jogo absorve por completo o jogador, lhe imputa funções e regras, atitudes e comportamentos. O jogo é como a História: dá-se filhotes!
O jogador é uma determinação do jogo, um elemento criado pelo jogo. Jogar, em essencial, é ser um jogado. Embora o sujeito do jogo seja o próprio jogo, haveria espaços para a criatividade, a habilidade, a percepção oportuna dos movimentos, os dribles, a superação de obstáculos. Ou para a manipulação dos atos [especialmente as palavras que fluem no ar rarefeito de resquícios de autoconsciência], ou fingir uma falta com escandalosos giros no chão, impura desfaçatez. Ou para as paranoias, a criação de estórias de conveniências, para surtos psicóticos narrados por agressividades e nutridos por violências nascidas na infância.
O jogo, como a História, possibilita a existência de uma realidade que está acima dos jogadores. Ao mesmo tempo, o jogo ilude o jogador colocando-o como protagonista do jogo, como astro, como líder, como dono de si. Essa é a fórmula de se perpetuar: o jogador cria a ilusão de que é o centro do jogo, o detentor do poder, a celebridade a ser celebrada. A torcida, como parte dos componentes do jogo, se emociona [ódio e amor, raiva e satisfação] cumpre o seu papel de estar ali, de ser-ali.
É o jogo, ou a História, que se faz, que se desenrola. Poderia ser de outro jeito, de outra maneira, mas sempre dentro da ordem do jogo. É o jogo o que é jogado, é a História que anda. No limite, não é o jogador que joga, mas o jogo que se desempacota, que se autocumpre. É do jogo! A condição de existência do jogador se faz pela condição de estar inserido numa ordem de fatos, acontecimentos, feitos, que o permitem se manifestar, existir, se relacionar. São as estruturas processuais com conexões funcionais que permitem o deslocamento no campo, na quadra, na rua, no trabalho, na família.
O processo eleitoral, como um jogo, como uma História, é um conjunto de ordenações que permitem a manifestação de cada jogador, que permite a distinção de funções e comportamentos, de atitudes e desejos. Há os que gritam contra o juiz [o próprio jogo] a querer transformar o jogo, a própria História. Destacam suas fragilidades pessoais e falta de habilidade em jogar. Com o “VAR” de cada para de olhos em todos os lugares, aqui e ali são desmascarados e suas virtudes caem defeitos em instantâneos do tempo. O jogo volta ao domínio, condição da qual nunca saiu. Nenhum jogador da História se destacou pelo grito [MAHATMA GANDHI, 1869-1948], e os que tentaram ser juiz eliminaram suas próprias pernas [ADOLF HITLER, 1889-1945].
O jogo, a História, o Processo Eleitoral são ordenações que exigem análises precisas do ambiente e das situações, compreensão integrada dos comportamentos dos jogadores, interpretação rigorosa dos dados. Não se faz planejamento e organização com gritos e agressividades e violências. É a paz interior e a leveza de não ser o juiz que possibilitam o bem-estar de ser jogador. Como método, de vez em quando se afastando, como quem admira uma obra de arte! Ser jogador é do Jogo!!
Sugestão de Trilha Sonora: 7 SECONDS
Artista: YOUSSOU N’DOUR et NENEH CHERRY
Autor: CAMERON McVEY, JONATHAN SHARP, NENEH CHERRY, YOUSSOU N’DOUR
Álbum: THE GUIDE [WOMMAT]
Ano de Lançamento: 1994
Crédito de Imagem: PINTEREST