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UM MUNDO A SE FAZER

JANUÁRIO, Sérgio S.

Mestre em Sociologia Política

 

A certeza sobre as coisas e sobre os fatos que nos ocorrem é uma enorme ilusão e insustentável fragilidade. Estar certo sobre as coisas possui uma tensão particular. A certeza leva à condição de suspensão da dúvida. Isso trava o posicionamento daquele que está sempre certo em dois sentidos. O primeiro é que perde a possibilidade de aprender. Se não há dúvida sobre os fatos e as coisas, então, não há mais nada a conhecer. Tolice! O que move a vida é a necessidade de entender um mundo inatingível. Somente os tolos param no meio do caminho desconhecido para falar sobre o fim da caminhada.

O segundo sentido é que todos os outros pensamentos e reflexões sobre o mundo e a vida precisam ser anulados e se produz a arbitrariedade sobre o aprendizado. Não há reciprocidade de ideias e conhecimentos. Para o tolo arbitrário, autoritário, o mundo que é assumido em suas verdades será exatamente aquilo que deve parecer a você. Você não poderá pensar diferente porque o arbitrário terá as respostas certas. Caberá a você sucumbir.

Como exercício pedagógico podemos agir como estranhos em nossa própria casa. Você poderá sempre solicitar o uso do banheiro de forma muito educada, ou tentar iniciar a alimentação depois de todos os outros no mais profundo silêncio e de cabeça erguida, como quem precisa de permissão. Você poderá tentar comprar algo na padaria por um preço muito abaixo do valor apresentado, sempre de forma muito polida, ou fazer perguntas de química ao professor de língua portuguesa repetidas vezes.

Os costumes sociais nos imprimem “comportamentos naturais” e nos permitem viver em grupo sem pensar sobre os motivos segundo os quais fazemos o que fazemos. Desde o aprendizado infantil, assumimos o mundo social e político como coisa natural, já organizado, estabilizado, estruturado, feito. Essa “naturalização” das coisas produz a própria organização da vida social e isso nos conforta. É difícil, muito difícil, sair dessas “amarras” porque cada nó nos dá segurança de viver a vida e fazer as coisas.

A eleição é um dos processos de organização que parece estar neutralizado frente aos nossos comportamentos. São fases, regras, ritos e atos que compõem um cenário estabilizado, feito. Tudo já está pensado e definido. É como aquela pessoa que sabe os “porquês” de todos os fatos, e que sente o sentimento do outro [empatia sem precedentes na História Humana] e, por fim, faz o julgamento das pessoas, condenando-as ou condecorando-as.

As eleições são movimentadas por Partidos Políticos e você, se quiser entrar nessa casa, precisa estar associado a algum deles ou ficará caminhando na rua. Os Partidos Políticos são organizações privadas com financiamento público e servem como suportes de telhado de uma casa: evitam que o mundo exterior possa lhe provocar danos. As janelas servem para que alguns integrantes possam mudar de casa sem prejuízo de seus postos, mas há tempo definido para isso. As portas servem para novos integrantes e convidados para conversas nas salas reservadas.

Tudo isso está estruturado, e nos permite “enxergar” um mundo já “finalizado”. A participação dos andantes nas ruas será em templo determinado com um sistema de pessoas e ritos definidos, em tempo determinado. Este formato cria o eleitor, mas não permite a cidadania política mais intensa. É preciso que os políticos saiam de suas casas políticas e caminhem ao nosso lado nas ruas. Este é um caminho para nos tornarmos cidadãos, sempre a se fazer!

 

Sugestão de Trilha Sonora: BEIJA EU

Artista: MARISA MONTE

Autor: MARISA MONTE, ARNALDO ANTUNES, ARTO LINDSAY

Álbum: MAIS

Ano de Lançamento: 1991

Crédito de Imagem: PINTEREST



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